Ao longo de sua história, a Ucrânia sempre sofreu invasões. O martírio de IVÁN BOIKO começou em 1939, quando o regime moscovita / soviético invadiu a Ucrânia. Assim que os russos tomaram a Ucrânia, imediatamente começaram a implantar o seu sistema comunista, confiscando todos os bens do povo e adaptando todos ao trabalho coletivo.
Em 1941 em virtude da segunda guerra mundial, com o avanço das tropas alemãs para o leste europeu, os russos abandonaram o território ucraniano e entrou a Alemanha. Logo que os alemães invadiram e dominaram a Ucrânia, começaram as barbáries da guerra. Os soldados nazistas percorriam as aldeias ucranianas, invadindo e saqueando as casas, estuprando as mulheres, além de outras atrocidades.
Os alemães estabeleceram uma regra: as famílias que tivessem três ou mais jovens em casa, independente do sexo, pelo menos um seria obrigado a ir trabalhar na Alemanha.
IVÁN BOIKO tinha duas irmãs. Uma ainda adolescente, mais nova que ele, a qual está viva na Ucrânia e que ele sonha em reencontrar, e outra mais velha que ele. Os alemães determinaram que a irmã mais velha fosse para a Alemanha. IVÁN BOIKO para proteger a sua família, conseguiu convencer os oficiais do exercito alemão a levarem ele no lugar dela. E assim foi feito. Ele foi arrancado da Ucrânia sem se querer ter se despedido da família.
IVÁN BOIKO chegou à Alemanha em 1942 e lá permaneceu fazendo trabalho forçado em diversas áreas / funções até 05 de abril de 1945, quando foi libertado pelas tropas aliadas, lideradas pelo exercito americano.
Todos que trabalharam na Alemanha foram declarados inimigos pelo governo (russo) soviético, sob a alegação de que tendo trabalhado na Alemanha, ajudaram diretamente o regime nazista de Hitler na guerra contra a Rússia, por isso eram considerados traidores.
Não era levada em consideração de que tinham sido obrigados pelos alemães àquela situação. Aqueles que tiveram a sorte de não terem sido assassinados pelos russos (se é que podemos chamar isso de sorte) foram enviados para o degredo na Sibéria.
Assim definiu IVÁN BOIKO essa situação: “Saímos da Gestapo, vamos para a KGB”.
Trinta países aceitaram acolher / dar abrigo a estes refugiados e/ou perseguidos de guerra, entre eles o Brasil.
IVÁN BOIKO e a esposa, também cidadã ucraniana que conheceu na Alemanha, se inscreveram então para virem ao Brasil. Isso já era no ano de 1947 e até então eles viveram em acampamentos organizados pela Cruz Vermelha e pela ONU (ainda em fase embrionária), onde se conheceram.
No dia 20 de abril de 1948, IVÁN BOIKO e a esposa chegam à cidade do Rio de Janeiro, transportados por um navio militar americano.
No dia 29 de maio de 1948 as 09h00min da manhã, IVÁN BOIKO, a esposa e a filha recém nascida, chegaram a Curitiba, sem conhecer absolutamente ninguém e não sabendo falar uma palavra em português. A única coisa que ele sabia era que em Curitiba o clima era frio, portanto mais parecido com o da Europa e que existia uma sociedade ucraniana e igrejas ucranianas.
Ele foi acolhido nos primeiros dias na sede da sociedade ucraniana, até hoje localizada na Rua Augusto Stellfeld, na região central da capital paranaense.
Na mesma semana, no domingo, ele foi até a igreja ucraniana situada na Rua Martin Afonso, localizada próxima à sociedade.
No dia seguinte apareceu um cidadão na sociedade ucraniana e levou IVÁN BOIKO e família para viverem em sua casa. Ele se emociona ao lembrar e diz:
“Nóis, quando nóis chegaram nesta casa, olha e viver com aqueles cidadões, e claro que cidadão de idade, né, e bem pobre também... e tudos vivia como uma família só. Um fogão, uma panela e uma conta eterna de gratidão pra paga... e graças a Deus... até eu abrir a minha vida por aqui no Brasil”.
Para sobreviver em Curitiba no começo ele fez de tudo. Aonde podia fazer qualquer coisa para ganhar um pouquinho, lá estava ele trabalhando. Jamais recusou um serviço, fosse qual fosse. A estabilidade veio quando conseguiu um emprego de costureiro na Policia Militar do Paraná, onde trabalhou por 27 anos consecutivos até se aposentar, confeccionando as fardas militares.
Mesmo com todas as dificuldades pelas quais passou ele se considera uma pessoa privilegiada por ter tido a sorte de ser acolhido aqui e tem um orgulho e amor pelo Brasil tão grande, que certamente deve superar muitos de nós brasileiros.
Em 1964, já estabilizado e totalmente integrado a sociedade curitibana, IVÁN BOIKO participava da Sociedade dos Amigos da Cultura Ucraniana existente no bairro do Portão, em Curitiba. Quando houve o golpe militar no Brasil naquele ano, segundo ele, foi à maior tristeza. A maioria dos imigrantes ucranianos vindos na terceira fase da imigração motivados pela segunda guerra mundial ficou com medo de reviver os pesadelos do comunismo soviético ou das atrocidades nazistas e começaram a migrar para a América do Norte, mais especificamente Estados Unidos e Canadá, onde existem grandes colônias de imigrantes ucranianos.
Os imigrantes das duas levas anteriores já estavam todos solidificados aqui e as motivações que os trouxeram, tinham sido outras.
Quando IVÁN BOIKO se deu por conta, já não tinha quase ninguém na sociedade dos amigos da cultura ucraniana, a qual tinha sido criada em 1948 justamente para acolher e abrigar os imigrantes novos que estavam chegando pós-segunda guerra mundial. Foi a partir da debandada dos seus compatriotas em 1964 que ele resolveu fazer o instrumento ucraniano BANDURA, como uma forma simbólica de acender novamente a chama da coragem e da esperança no coração dos ucranianos que aqui permaneceram.
A BANDURA é o mais popular dos instrumentos musicais ucranianos. É o símbolo da resistência nacional na busca da liberdade e da independência da Ucrânia. A BANDURA esta entrelaçada com a própria história milenar do povo ucraniano.
O som de suas cordas embalou os sonhos ucranianos provavelmente com maior intensidade à época dos cossacos. Em certa época, o Tzar da Rússia baixou decreto proibindo o uso da BANDURA, temeroso de que, através das suas mensagens, revivesse no povo ucraniano o desejo de reconquistar a liberdade. Os infratores, além de perderem o instrumento, eram punidos com severas penas, inclusive com o degredo para a Sibéria.
Durante a época de Stalin, quando a Ucrânia então subjugada à União Soviética, possuía resistências muito fortes à incorporação, muitos Banduristas foram eliminados e instrumentos foram transformados em fogueira. Isso porque, sendo o instrumento musical nacional da Ucrânia, a BANDURA tornou-se um símbolo de liberdade e um povo aprisionado em sua autodeterminação não podia ter ideal libertário.
IVÁN BOIKO não tinha a mínima noção de como era feito um instrumento destes, já que na região rural da Ucrânia onde ele nasceu não existia BANDURA. Sem nada conhecer do assunto e nem dispor de equipamento adequado (apenas um machadinho), contudo, a partir de uma foto do instrumento em um jornal, dedicando para isto todos os seus momentos de folga, conseguiu o seu intento.
O primeiro instrumento que IVÁN BOIKO produziu (todo tordo) é considerado hoje um patrimônio cultural da comunidade ucraniana do Paraná e, desde que iniciou o oficio há mais de 30 anos, IVÁN BOIKO já fez um número superior a 600 BANDURAS, todas manualmente, sendo as mais recentes tecnicamente tão perfeitas quanto às fabricadas na Ucrânia. Até hoje ele é o único a fabricar BANDURA no Brasil.
A partir do trabalho iniciado pelo senhor IVAN BOIKO, o interesse pela BANDURA intensificou-se no Brasil. Ele próprio organizou no começo um grupo chamado “Banduristas Ucranianos de Curitiba”, o qual existiu por 27 anos e fez apresentações públicas em diversas regiões do Brasil. Hoje existem dois grupos e escolas de Banduristas no Brasil: A “Capela de Banduristas FIALKA” em Curitiba e o “Grupo SOLOVEIKO” em Prudentópolis/Pr.
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